Eu quero, pois trabalho com judeus, estudo a questao do holocausto e preciso de mais relatos assim para minha pesquisa.
Hoje trazemos a história de nossa usuária Claudia Almeida Bock de Gari. Nascida em 1951 em São Paulo, Cláudia é filha de Walter Bock e Margarete Joseph Bock.
Cláudia é casada, tem uma filha e um neto e é formada em Artes Plásticas pela FAAP. Ela criou sua árvore genealógica em 2010 e usou o MyHeritage, para criar a árvore, pesquisar e confirmar datas de nascimento, morte e parentescos e os colocar em um livro: “Prisioneira 75841, história de Margarete Joseph”, que foi lançado em 2015.
O título do livro deve-se ao número que sua mãe recebeu como prisioneira, ao chegar no campo de concentração nazista de Auschwitz-Birkenau. Infelizmente, só Margarete saiu viva de lá, seus pais não tiveram a mesma sorte.
Cláudia conta como surgiu a idéia do livro:
“Quando minha mãe faleceu, em 1991, trouxe para minha casa uma cesta com muitos papéis amarelados e fotografias antigas. Esta cesta ficou muitos anos no meu armário. Em 2006 recebi um convite para ir a Dorsten, Alemanha, cidade onde meus avós moravam, para estar presente a uma homenagem às famílias judias que lá moraram e foram deportadas para os campos de concentração na 2ª grande guerra.
Eu sabia pouco da vida da minha família, pois minha mãe falava pouco sobre seu passado ( talvez para preservar os filhos de conhecerem de perto o sofrimento pelo qual passou) portanto tive que me preparar para minha ida. Abri a cesta e comecei a separar recortes de jornal , telegramas, cartas, manuscritos, árvore genealógica e fotografias.
Na minha volta envolvida com os fatos, senti necessidade de deixar registrado tudo o que ela e meus avós haviam passado. Quando me perguntam, se minha mãe falava sobre a guerra eu só me lembro dela dizer que eles só tinham cascas de batatas e ovos velhos para comer. Ela também contou que foi operada no joelho, sem anestesia e que tinha que aplicar injeções em soldados alemães. Hoje, eu me arrependo muito de não ter perguntado mais, saber mais sobre este período tão difícil, mesmo sabendo que não seria nada fácil para ela contar. Talvez minha mãe tivesse se aberto mais conosco, se eu tivesse mostrado interesse. Mas a vida é assim, nem sempre estamos prontos, para perguntar as coisas na hora certa, ou para ouvir…”
Ter perguntado mais e ter ouvido mais é provavelmente um desejo comum a muitos filhos, netos e outros descendentes de sobreviventes do Holocausto. Cláudia Gari também perguntou pouco e sabia pouco da sua mãe. Ela teve que reconstruir toda a sua história, num trabalho de genealogia bastante penoso. Mas durante a sua visita a Dorsten, em 2006, ela estava determinada a descobrir o máximo possível. Ela conseguiu vários documentos que a ajudaram nesta empreitada. As fontes usadas foram principalmente cartas, documentos e fotos que sua mãe tinha guardado em uma caixa, bem como documentos e livros que ela encontrou na cidade de Dorsten.
Cláudia queria descobrir quem eram seus avós, quem era sua mãe. Sua mãe Margarete era filha de Louise Reichhardt (nascida em 1883) e Ernst Joseph (nasc. 1884). Seus pais se casaram em 1910 e mudaram-se um ano depois para Dorsten, onde tiveram uma loja. Em 1912 nasceu o primeiro filho do casal: Heinz. Durante a 1ª grande guerra Ernst Joseph serviu como enfermeiro e sua esposa continuou a tocar a loja com a ajuda da sua irmã. Em 1919, terminada a guerra, a família Joseph compra então uma nova loja: uma mistura de loja de chapéus, perfumes e moda feminina.
Também bastante importante foi uma conversa que teve com uma freira que se lembrava de Margarete:
“Ela era uma aluna muito aplicada e dedicada. Todos elogiavam a Margarete. Um dia a professora perguntou para os outros alunos: ‘Porque vocês não seguem o exemplo da Grete?’ Porém, no dia seguinte, uma mãe furiosa apareceu na escola perguntando: como é que alguém pode dizer que uma menina judia pode servir de exemplo?”.
Aos poucos, Cláudia vai explicando no livro, como a vida na Alemanha dos anos 30 ia mudando. Seu avô já não era cumprimentado quando chegava no correio. Vizinhos e conhecidos atravessam a rua quando o vêm, para não ter que conversar com ele. Louise e Ernst Joseph decidem então vender a loja e sair da cidade de Dorsten.
Uma freira ursulina, que conhecia bem a aluna Margarete ainda oferece para ficar com a menina na escola, cobrindo ela mesma todos os custos, mas seus pais, apesar de terem ficado muito agradecidos com a oferta, decidem recusá-la.
Em maio de 1934, a família Joseph parte então para a cidade de Roterdã, com pouco dinheiro no bolso e sem falar holandês. “Um salto para o desconhecido”, era como Margarete costumava se referir a esta mudança. Os pais de Margarete abrem uma perfumaria e ela começa a fazer um curso de corte e costura. Em seis meses ela já estava fluente em holandês. Anos mais tarde, ela diria que ela via a Holanda como a sua pátria e que os holandeses eram seus irmãos e irmãs: “Eram pessoas de caráter. As melhores pessoas que já conheci na minha vida”.
Em 1938, Heinz, o irmão de Margarete muda-se com a esposa para o Brasil e se estabelece como fotógrafo em São Paulo. Cláudia conta que nesta época a casa dos seus pais em Rotterdam não havia sido atingida pelos bombardeios, porém, a vida era bastante difícil devido às várias sanções impostas aos judeus, pelos nazistas. Após 6 meses da ocupação da Holanda pelos nazistas, os Josephs tiveram que se mudar novamente. Eles foram então para Apeldoorn, mas o comércio já não era uma opção viável para a família. Margarete começou a trabalhar em um hospital, numa cidade próxima e visitava a família nos finais de semana, de bicicleta. Até que a bicicleta, após uma nova regra nazista em 1942, também acabou por ser confiscada. A partir do dia 2 de maio daquele ano, era obrigatório usar a estrela de Davi no peito, para todos os judeus.
No dia 1º de outubro de 1942, Ernst Joseph foi mandado para o campo de concentração de Vught e depois foi transferido para Westerbork. Sua esposa é mandada para lá um dia depois. Neste campo, no dia 16 de outubro de 1942, Margarete vê seus pais pela última vez, quando seus pais foram transportados para a Polônia. Margarete tenta seguir o conselho do seu pai de seguir trabalhando e tentar ficar na Holanda a qualquer custo.
Porém, no dia 3 de março de 1944, Margarete, juntamente com outros judeus de Westerbork, são também transportados para fora da Holanda. A viagem, realizada em vagões para transporte de carga, dura dois dias e duas noites e acaba em Auschwitz. Em seu livro, Cláudia narra em detalhes como foram os 10 longos meses, que sua mãe sobreviveu neste campo de extermínio: somente aqueles que eram verdadeiramente fortes e que se juntavam ao grupo daqueles que ainda podiam caminhar, eram poupados de serem encaminhados diretamente para os caminhões, que levariam as pessoas para a câmara de gás. Margarete era forte. Juntamente com centenas de outros ela foi caminhando até o campo de Birkenau. Lá ela foi tatuada com o número 75841, seus cabelos foram cortados à força, ela foi humilhada, despida, degradada e sobreviveu ao frio, fome, medo e terror.
Ela também conta sobre as doenças que frequentemente dizimavam os campos de concentração: tifo, malária; conta sobre a crueldade dos soldados e do trabalho pesado.
Em janeiro de 1945, é iniciada a grande marcha de Auschwitz. 60 mil prisioneiros são levados a pé a outros campos de concentração espalhados pela Alemanha. Margarete, com apenas um cobertor fininho e um casaco na cabeça, consegue chegar em Ravensbrück – um campo de concentração feminino, sem ter o mesmo destino que muitos outros: a morte pelo frio. Ela sobrevive mais uma vez.
Finalmente, vem a capitulação nazista, a quase incredibilidade de que o fim desta guerra tinha mesmo chegado e o anseio pela tão sonhada liberdade. Margarete passa por Bergen-Belsen, até chegar em Emschede, em 9 de maio de 1945. Margarete volta para Holanda, lembrando-se das palavras do seu pai, de ficar na Holanda, para salvar sua vida. No dia 15 de maio de 1946, ela embarca no vapor “Alcor”, em Rotterdam e quase um mês depois ela desembarca no porto de Santos. Graças a um diário escrito por Margarete, Cláudia consegue descrever bem a viagem da mãe e ver o otimismo de uma moça de 26 anos, a caminho de uma vida nova na América do Sul.
A vida no Brasil traz finalmente a tranquilidade: ela se casa com Walter Bock, em 1948, e leva uma vida confortável em São Paulo.
Cláudia comenta: “da pequena árvore genealógica que minha mãe deixou no seu “livro da vovó” com 8 nomes, consegui através do site MyHeritage chegar a 250, com diversos pedidos de inclusão que me permitirão chegar a mais de 500 nomes.” Ou seja, Cláudia mostra aqui claramente, que ninguém deve desanimar por saber pouco sobre a sua família, ou mesmo quase nada. Com determinação e vontade é possível reconstruir o passado da família. E o livro dela é prova disso.
Agradecemos a Cláudia pelo seu relato e por compartilhar conosco uma história de vitória e superação! E desejamos muito sucesso com o seu livro e com a pesquisa da história da sua família.
Para todos que estão curiosos em ler com mais detalhes o livro de Cláudia, temos o prazer de anunciar que vamos realizar um sorteio: é só comentar que quer participar nos comentários aqui do blog mesmo e esperar com os dedos cruzados pelo resultado do sorteio, que será realizado no dia dos pais. Para os que não querem esperar e que desejam garantir agora o seu exemplar, entrem em contato com a Cláudia através do email: claugari@gmail.com.
Você também tem uma história inspiradora para contar? Então, envie um email para: brasil@myheritage.com! Nós iremos publicar a sua história aqui no blog e ainda damos um pequeno presente pela participação.
Jomar
12 de julho de 2016
Eu quero